Marvel’s Spider-Man é um jogo eletrônico de ação e aventura desenvolvido pela Insomniac Games e publicado pela Sony Interactive Entertainment em Setembro de 2018 como exclusivo para PS4. O game também conta com a DLC “A Cidade que Nunca Dorme”, dividida em três episódios adicionais: “O Assalto”, “Guerras Territoriais” e “Comando Silver”.
O título arrecadou diversas indicações e prêmios, entre eles: The Game Awards (nas categorias: jogo do ano, melhor performance, melhor design de áudio, entre outras), BAFTA e Writers Guild America Award (na categoria: melhor roteiro para games).
Esta é uma análise livre de spoilers.
Dona Aranha: uma peróla narrativa
Categoricamente falando, Spider-Man é inestimável surpresa, grande tributo e justa redenção. Mais do que isso, é a homenagem suprema aos fãs de curta e longa data do Homem-Aranha.
Os roteiristas miraram tão alto quanto poderiam quando, ao invés de reproduzir qualquer arco dos quadrinhos, criaram sua própria história. E para nossa sorte, estavam enxergando perfeitamente bem. Portanto, o enredo age como uma síntese, sendo uma jornada completamente original que reúne elementos das décadas de existência do herói presentes em outras mídias. Como uma carta aberta aos fãs da figura mais popular da Marvel, o personagem é escrito e representado como sempre quisemos vê-lo em uma tela maior do que a folha A4: imparável, incansável, tagarela, sarcástico, altruísta e espetacularmente humano.
O paralelo da vida de Peter Parker com seu alter ego é absolutamente fiel à lore do herói: um homem com problemas em administrar literalmente todos os aspectos da sua vida, do coração à carteira, genial e genuinamente engraçado, dotado de poderes fantásticos e atormentando-se com a culpa resultante da impotência perante uma tarefa impossível: salvar tudo e a todos.
Ao longo do game, enfrentamos trechos que vão muito além da aranha branca no peito, assumindo a pele de personagens secundários como Mary Jane, por exemplo, e até mesmo Peter Parker em carne e jaleco. Alternando entre combates muito bem otimizados, gameplay furtiva e cenas cinematográficas acompanhadas de trilhas sonoras arrepiantes, iremos pouco a pouco nos familiarizar (e até mesmo emocionar) com a jornada de um herói formado, que inicia com Peter Parker já há anos sob o manto de Homem-Aranha, sem a necessidade de colocarmos mais projéteis desnecessários no torso de Ben Parker em uma noite a céu aberto.
Sendo assim, temos à nossa frente uma obra de arte, que inicialmente nos banha em nostalgia, e gradualmente escurece, onde em seu ápice vemos toda a glória de um personagem que tem como sua maior fonte de poder aquilo que nos difere dos demônios que tememos em confrontar. Uma jornada que reforça o conceito de que um herói é apenas tão bom quanto seus vilões.
Subindo pelas paredes: Desenvolver vertigem nunca foi tão divertido
Em quesitos técnicos, Spider-Man é recheado com trilhas sonoras memoráveis unidas a cenas graficamente invejáveis, que irão provocar no jogador uma mistura de emoções positivas e negativas. Cada frame retrata o momento perfeito para uma fotografia, com composições, luzes e ângulos hollywoodianos. E com a função “Modo Foto”, saciar esse tipo de vontade é perfeitamente possível.
Surfar por Nova Iorque com teias de todas as direções em alta velocidade é algo que exige certo treino, moderada tolerância ao enjôo e, preferencialmente, não ter um histórico de tonturas. Atendendo a estes requisitos, garanto que dificilmente você irá se cansar de fazer manobras sobre os arranha-céus que desaparecem no céu cinza azulado de Manhattan.
O game também possui um sistema de combate intuitivo, explicitamente inspirado nas mecânicas da trilogia Batman Arkham. E estas inspirações são reveladas a todo momento, seja em lutas quase que coreografadas, uma vez que o sistema de combos e variações de movimentos permite uma experiência cinematográfica em trechos de gameplay com uma generosa destruição de cenários, ou em abordagens furtivas com técnicas predatórias, que podem ser usadas como você bem entender. Em ambos os casos, os movimentos são suaves e bem otimizados, com batalhas desafiadoras que exigirão de você aprimoramentos a serem conquistados em missões secundárias e atividades pela cidade.
Portando elementos de RPG, o game nos fará correr atrás de recompensas em muitas outras tarefas longe da principal, como encontrar itens colecionáveis, solucionar mistérios, conter crimes etc. A partir destas recompensas, iremos evoluir em um sistema de níveis modesto, adquirindo novas habilidades e evoluindo nossos equipamentos de variedade razoável. Nosso arsenal também irá contar com diferentes trajes a serem desbloqueados, cada um trazendo diferentes habilidades, que podem ser customizadas. Boa parte deles faz referências diretas a arcos famosos dos quadrinhos, ou mesmo dos filmes e animações.
A inteligência artificial, embora seja bem rudimentar, poderá proporcionar desafios para o jogador de acordo com o número de combatentes na tela. Como o jogo possui um sistema de dificuldade bastante personalizável, é possível tornar sua experiência a mais adequada possível.
Entretanto, nem mesmo as obras de arte escapam ilesas de alguns pequenos erros amadores.
Chuva forte: os buracos na teia
Mesmos os títulos mais detalhistas apresentam leves falhas, que no geral não comprometem a jogabilidade, mas nesse caso são um incômodo no retrato detalhista do exclusivo da Sony. A começar pela dublagem, que embora seja perfeitamente compatível com as personagens principais, vira e mexe é acometida por diversos bugs de áudio, entre eles vozes de NPCs em inglês, dessincronização de som com imagem e escalas de volume. Existem, de fato, outros problemas técnicos característicos dos títulos do gênero, como NPCs correndo contra paredes e demais pormenores.
A impossibilidade de se alterar o idioma do game sem modificar as configurações do console também caracterizam um problema sério, já que limitam as preferências do jogador. E sejamos francos, por motivos autorais ou não, é desagradável ouvir todos os nomes de personagens em inglês atropelados dentro de uma dublagem brasileira.
O grande caráter imersivo de Spider-Man torna impossível finalizá-lo apenas uma vez, o que nos leva a questionar sua vida útil. Embora bastante variado e extremamente divertido, estamos falando de um jogo relativamente curto que pode buscar se estender com atividades repetitivas. E para um título de 2018, é natural que estivéssemos aguardando algo mais duradouro. Essa lacuna pode ser preenchida através do conteúdo adicional disponível. O lado ruim é não ser grátis. O lado bom pode ser discutido em análises futuras.
Veredito: pegajoso
Em conclusão, podemos dizer que Marvel’s Spider-Man é uma carta aos fãs, endereçada com maestria para todos aqueles que, durante muito tempo, aguardaram a experiência definitiva do herói favorito de Nova Iorque. Com uma história original, gameplay imersivo, inúmeras referências e falhas quase irrelevantes, o maior erro da aventura produzida pelo Insomniac é não ser tão longa quanto gostaríamos. Sempre estaremos dispostos a retornar para uma Manhattan que nos fará derramar lágrimas e sangue, através de uma narrativa que contempla toda a glória da obra de Stan Lee.
Marvel’s Spider-Man é um game que porta grande poder. E de tal maneira, também consegue cumprir com todas as suas grandes responsabilidades.
Excelsior.
Uma cópia digital do título foi concedida pela Insomniac para realização desta análise.
Revisão: Icaro Sousa